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Uma psicóloga explica porque os perfeccionistas sofrem de cansaço oculto e como relaxar o sistema nervoso de forma suave.

Homem preocupado a trabalhar num escritório com dois monitores e uma chávena de café na mesa.

Os perfeccionistas muitas vezes parecem bem por fora. Por dentro, estão a correr uma maratona em areia. Uma psicóloga clínica explica porque é que a vontade de fazer tudo bem feito esgota o corpo silenciosamente — e como permitir ao sistema respirar sem se desmoronar.

O cursor piscava como um pequeno metrónomo, a contar as batidas de um coração que não abrandava. Uma colega tinha dito “Está ótimo”, e ela acenou com a cabeça, depois mudou três vírgulas, depois quatro, depois reescreveu a saudação porque, de repente, pareceu-lhe demasiado informal.

Os ombros doíam-lhe, mas o cansaço não lhe trazia sono. A cama era uma reunião com o turno da noite da mente — a verificar, ensaiar, repassar. Todos já tivemos aquele momento em que algo pequeno parece que determina todo o dia.

O café ajudou de manhã, e o elogio ajudou ainda mais. O custo silencioso chegava mais tarde, de forma quase impercetível. O corpo pensa que o tigre é o erro tipográfico.

Porque é que os perfeccionistas vivem num stress oculto

O perfeccionismo não vive apenas nos pensamentos. Vive nos alarmes do corpo, incitando-te a vigiar, corrigir, proteger. Pareces composto. Por dentro, o teu sistema está a gerir micro-ameaças — erros, olhares, timings — como se fossem tempestades.

Eis o paradoxo: quanto mais te importas, mais o teu sistema nervoso acelera. É por isso que o cansaço é muitas vezes “invisível” no trabalho e depois pesa em casa. Não é preguiça nem fraqueza. É um estado de alto desempenho que cobra um preço privado.

Pensa na Maya, uma designer de produto que entrega trabalho impecável. O smartwatch assinalava sono “em alerta elevado” mesmo nos dias calmos. Sentia-se simultaneamente acelerada e esgotada, uma mistura a que chamou “cansada e ligada”.

No papel, nada estava errado. Cumpria todos os prazos. Sorria nas reuniões. A quebra surgia depois, no sofá, onde até escolher um programa parecia stressante. O cérebro dela não era mau; era protetor. Simplesmente, não sabia quando a corrida tinha terminado.

Eis uma perspetiva da neurociência: quando o teu cérebro vê uma tarefa como arriscada, o ramo simpático entra em ação. O sangue vai para os grandes músculos, o foco estreita-se, a respiração acelera. Ótimo para perigo real, cruel para apresentações em PowerPoint.

Acumula esses picos ao longo do dia e ficas com carga alostática — desgaste de estar sempre “ligado”. O córtex pré-frontal força os padrões a permanecerem elevados, enquanto zonas mais profundas procuram erros. Esse “braço de ferro” consome energia. Esse custo sente-se como nevoeiro mental, irritabilidade ou uma dor estranha sem nome.

Como libertar gentilmente o sistema nervoso

Pensa em “micro-libertação”, não numa mudança radical. Experimenta este reinício de 60 segundos: Orienta—Expira—Escolhe. Primeiro, orienta os teus sentidos: diz três cores que vês, três sons que ouves, três pontos de contacto com o corpo. Depois, faz seis longas expirações, tornando a expiração um pouco mais prolongada.

Finalmente, escolhe um passo “suficientemente bom” que possas completar em dez minutos. Põe um temporizador, faz apenas isso e pára. Estás a ensinar o teu sistema que é possível completar uma tarefa em segurança sem aperfeiçoar. O sinal é importante. Estás a associar o esforço ao alívio, não à revisão interminável.

Os obstáculos comuns aparecem rápido. Os perfeccionistas transformam a auto-regulação noutra tarefa de perfeição: monitorizam a frequência cardíaca, otimizam proporções de respiração, avaliam o seu próprio relaxamento. Isto não é uma folha de cálculo. Deixa a tua respiração ser um pouco desordenada. Deixa que a prática seja curta e real.

Outro problema: esperar sentir calma antes de começar. Por vezes, a ação gera a calma que procuras. E se saltares um dia, não falhaste. És humano. Sejamos honestos: ninguém faz mesmo isto todos os dias.

A dimensão é o teu aliado secreto. Reduz a tarefa até que o teu corpo não recue. Define uma regra de paragem que possas cumprir, como “duas revisões, depois enviar”. Começa pequeno o suficiente para o sucesso parecer até aborrecido.

“O perfeccionismo não é amor pela excelência — é medo de exclusão. A excelência expande-te. O perfeccionismo encolhe-te.”
  • Orientação de um minuto: três cores, três sons, três pontos de contacto.
  • Sinal respiratório: expirações mais longas, seis vezes, maxilar relaxado.
  • Ajuda à decisão: “duas revisões e enviar” ou temporizador de dez minutos.
  • Verificação corporal: ombros, maxilar, barriga — relaxa um nível.

O que muda quando a precisão encontra a gentileza

Eis o que vejo em consulta quando as pessoas aliviam o controlo do perfeccionismo: a capacidade regressa. Não de repente, não de forma dramática. Manhãs mais estáveis, noites mais leves, um projeto que termina sem queda abrupta. Continuas a importar-te. Só que o cuidado deixa de ser movido pelo pânico.

Muitas pessoas dizem-me que ganham uma hora extra de energia útil, espalhada pelo dia. Essa hora pode estar escondida na forma como agora sais da reunião sem repeti-la mentalmente durante uma hora. Ou na maneira como envias o email à segunda revisão, e não à quarta.

A vida real continuará a trazer prazos e expectativas. Mas o sistema nervoso aprende. Quando ligas o esforço a uma paragem clara e a uma expiração suave, o teu cérebro actualiza o conceito de segurança. Começas a confiar que bom trabalho não precisa que o teu corpo pague o dobro. Partilha isto com quem parece estar bem. Pode estar a carregar mais do que imaginas.

Ponto chaveDetalheInteresse para o leitor
O perfeccionismo alimenta fadiga ocultaFatores de stress microscópicos mantêm o sistema de alerta “ligado” o dia todoDá nome ao que sentes mas não consegues mostrar
Pequenos resets acalmam o sistema nervosoOrientar–Expirar–Escolher em 60 segundos, associado a uma regra de paragemAlívio prático para usar à secretária
Mudar para trabalho suficientemente bomDuas revisões e enviar; sprints de dez minutos; reduzir o âmbitoPermanecer com qualidade, sem esgotamento

Perguntas Frequentes:

  • Como saber se o meu cansaço se deve ao perfeccionismo ou a um problema de saúde? Se sentes também tonturas, dores inexplicáveis ou humor persistentemente baixo, fala com um profissional de saúde. A fadiga perfeccionista costuma aliviar quando mudas a forma como trabalhas e paras, mesmo que pouco. Questões médicas merecem atenção direta.
  • Baixar os padrões não vai piorar o meu trabalho? Não, se passares de “impecável” para “adequado ao objetivo”. A precisão importa; a revisão incessante raramente altera o resultado. Experimenta duas revisões atentas e depois pede feedback. A qualidade geralmente melhora quando o cérebro não está em alerta.
  • Quanto tempo demora a acalmar o sistema? Minutos para notar uma diferença, semanas para sentir que ficou. Pensa em efeito acumulado: pequenos resets ao longo dos dias treinam o alarme. Estás a construir tolerância pela conclusão “suficientemente boa”.
  • E se os meus prazos forem mesmo apertados? Usa micro-pausas entre tarefas, não durante o esforço intenso. Acrescenta uma regra de paragem que possas cumprir. Dá prioridade ao que faz a diferença e classifica o resto como “bom para melhorar”. A tua energia é um recurso, não um rumor.
  • Aplicações e wearables podem ajudar? Temporizadores ajudam nas regras de paragem, e lembretes suaves podem sinalizar para respirar. Tem cuidado para não te medires demasiado e criares tensão. Terapias como TCC, ACT ou abordagem somática podem ajudar se quiseres mais apoio.

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