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Este satélite japonês pode gerar eletricidade ao captar relâmpagos do espaço.

Satélite em órbita acima da Terra com relâmpago iluminando nuvens escuras e um furacão.

Um conceito japonês para satélite pretende aproveitar energia das tempestades, não ao sofrer impactos diretos, mas sim recolhendo os salpicos de rádio que cada relâmpago lança para o espaço. Parece ficção científica. A equipa afirma que está mais próximo de um truque radioelétrico ultra-preciso.

Numa noite húmida em Tóquio, a chuva bordava o horizonte e o rio Sumida reluzia com néons dispersos. Abriguei-me sob a cobertura de uma loja de conveniência enquanto o trovão ribombava como um velho comboio, observando as nuvens a pintarem o céu de roxo. O telemóvel acendeu-se com um alerta sobre um satélite japonês a tentar algo audacioso: transformar o estrondo dos relâmpagos em eletricidade, a partir do espaço. *O título pareceu um exagero, mas a física aguçou a minha curiosidade.* Por trás do burburinho, estava uma pequena e calculada aposta num novo tipo de energia. Um truque discreto com tempestades barulhentas. Uma promessa estranha.

Relâmpagos, engarrafados de outra forma

A ideia é desarmantemente simples. Não persiga os raios; capture o eco eletromagnético que disparam para o céu. Um satélite compacto, a voar a algumas centenas de quilómetros de altitude, estende antenas em laço afinadas para as frequências baixas do trovão — aqueles “sferics” crepitantes que atravessam a ionosfera. Os circuitos retificam pequenos surtos, armazenam-nos em supercondensadores, e depois alimentam a eletrónica de bordo. Não é uma cidade no céu alimentada por trovoadas. É **raios a partir da órbita**, gota a gota, suficiente para manter uma pequena plataforma operacional nas regiões mais eletrificadas do planeta.

Aqui está uma escala que pode imaginar. A Terra regista dezenas de milhões de relâmpagos por dia, cerca de 40 a 50 por segundo em todo o mundo. Cada descarga liberta uma energia impressionante ao nível do solo, mas apenas um sussurro desse poder ascende em forma de rádio. Um satélite não consegue absorver um raio; capta o batimento rádio da tempestade e recolhe migalhas. Laboratórios no Japão têm testado essas migalhas com “sferics” simulados, impulsos que duram de nanossegundos a milissegundos, convertendo picos em milijoules. É modesto. Ainda assim, uma passagem sobre a Bacia do Congo ou o Golfo de Tonquim — zonas globais de tempestades — pode ser suficiente para encher um pequeno buffer para enviar dados ou captar uma leitura de sensor.

Pense nisto como travagem regenerativa, mas para o clima. A física segue uma cadeia limpa: o relâmpago emite energia de largo espetro; a ionosfera canaliza uma parte dessa energia para modos de baixa frequência; as antenas acoplam esses campos; retificadores e comutadores inteligentes guardam carga entre impulsos; um gestor de energia decide como gastar. O segredo está no tempo e na correspondência de impedância, não na força bruta. As janelas de captação são irregulares e curtas. A órbita dita quando o satélite sobrevoa zonas de tempestades, e a atmosfera nem sempre colabora. Ainda assim, a matemática diz que **energia absorvida via rádio** pode completar o orçamento energético de um CubeSat se o satélite for paciente e engenhoso.

Por dentro de um satélite que "bebe" tempestades

Imagine o processo. O satélite deteta relâmpagos na Terra com um pequeno sensor ótico ou usa mapas globais de relâmpagos enviados por redes terrestres. Quando se aproxima de um aglomerado de tempestades, entra em modo de captação: as antenas acordam, os filtros ajustam-se, os retificadores fixam-se. A energia chega em surtos — irregulares, por vezes abundantes, outras vezes escassos. Um banco de supercondensadores recebe os impactos e suaviza o caos. Depois, um controlador de baixa fuga distribui a energia pelo essencial: sinais de temporização, gravação de memória, ou talvez um sensor climático que precise de um impulso rápido. Não é glamoroso, **mas é pequeno e real**.

Os equívocos comuns começam pela imagem na nossa cabeça. Imaginamos Thor. O satélite não está a apanhar uma lança de fogo; está a surfar nas ondas de rádio. Todos conhecemos aquele momento em que um título parece mágico, e preenchemos as lacunas com desejo. Assim nasce o “hype”. Se quiser saber o que é real, pergunte coisas simples: Qual a banda de frequências que capta? Como armazena e gere a energia? Quanta energia recolhe por passagem sobre uma zona de tempestades? Como lida com ruído da própria nave? Sejamos honestos: ninguém lê realmente o anexo técnico antes de partilhar.

“Não apanhamos raios; saboreamos o pós-brilho do trovão.”
  • Altitude orbital: algumas centenas de quilómetros, onde ainda chegam os surtos rádio dos relâmpagos.
  • Captação por passagem: milijoules a alguns joules, dependendo muito da densidade das tempestades e do ajuste das antenas.
  • Armazenamento: supercondensadores robustos, aceitam carga rapidamente e suportam muitos ciclos.

O que pode mudar — discretamente

Se isto funcionar minimamente, muda a nossa forma de pensar a energia no espaço. Os satélites vivem sobretudo da luz solar, e isso não vai mudar. Mas “beber tempestades” abre um canal secundário para missões pouco exigentes que dependem de paciência e oportunidade. Pense em sensores de humidade em florestas tropicais a comunicar por satélite, ou bóias oceânicas com baterias mínimas a recorrer à energia das tempestades para enviar dados meteorológicos. Pense em instrumentos espaciais que preferem silêncio e só precisam de energia em rajadas curtas — carregados pelo próprio ritmo do céu. A verdadeira mudança é psicológica. Quando aceita que o planeta pode ser parceiro energético, começa a procurar outras energias ambientais que estão à vista. Não os fogos de artifício, mas os restos. O caminho em frente não será ruidoso. Será iterativo, focado em dados, e ligeiramente estranho no melhor sentido. É assim que os avanços costumam parecer quando vistos de perto.

Ponto-chaveDetalheInteresse para o leitor
Como capta energiaAntenas em laço captam surtos de rádio de baixa frequência dos relâmpagos, retificados e armazenadosDesmistifica a ideia de “apanhar raios”
O que alimentaEletrónica de pouca duração: sensores, memória, telemetria breveDefine expectativas realistas e casos de uso
Porquê importanteCria um suplemento de energia em regiões com tempestades frequentesMostra potencial de sistemas espaciais resilientes e ultra-eficientes

Perguntas frequentes:

  • O satélite é realmente atingido por relâmpagos? Não. O raio não chega à órbita. O sistema capta a energia radioelétrica que o relâmpago radia para cima.
  • De quanta energia falamos? Quantias minúsculas — de milijoules a alguns joules por passagem sobre tempestade. Suficiente para tarefas rápidas, não para operações continuadas de alta potência.
  • Algum dia poderá alimentar casas ou cidades? Não. Isto é um nicho, energia a bordo de veículos espaciais. Redes elétricas terrestres precisam de energia massiva e constante, o que isto não oferece.
  • O que há de novo comparando com os painéis solares? Acrescenta um canal de reserva quando falta luz solar ou missões necessitam energia extra sincronizada com sobrevoo de tempestades.
  • Já existe algum satélite deste tipo no espaço? Investigadores japoneses estão a explorar protótipos e conceitos de missão. As primeiras demonstrações focam viabilidade, eficiência e controlo de ruído.

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